14/05/2007

Olhos cegos

A dor o marca e imprime apatia ao seu olhar. Tenta passar um ar despreocupado que seus olhos desmentem. Sinto o que ele sente: seu desconforto, suas angústias, sua dor; sentimentos tão intensos que me afetam e passam a ser também meus. Sou neste momento parte de seu ser. Meu corpo passa a pedi-lo e rejeitá-lo. Quero-o perto a todo instante, e distante, no esquecimento de si mesmo. Quero-o inteiro e não o tenho.

Mas ele me olha de cima a baixo como se esperasse meu consentimento e meu olhar não consegue dizer não. Quero não querer seus afagos, seus beijos, seu olhar que me atravessa revelando e desvendando. Passar a não significar e sem o sentir perto, junto, dentro de mim. Suas caricias já não tem o significado de antes, sei que é seu desejo que impera e o impele a saciá-lo. Seus olhos me comem, imperiosos de desejo como um lince selvagem que encara a presa. Mãos firmes que me tocam, escorregam, deslizam pelos cabelos lisos descendo suavemente a percorrer os seios firmes enrijecidos ao toque, percorrendo o corpo, estremecido de desejo. Saber e sentir sua dor leva a me alimentar de seu desejo. Uma momento apenas que se prolonga no subir e descer da tentação.

Ele é o predador, eu a caça. Quer me comer e desejo ser devorada, ansiosa pela morte. E o que morre são os sentimentos num devorar atros. A consciência me atormenta e a lucidez me causa repulsa. Resta-me o desprezo a ele como a um verme imundo que me toca, lambuzado de gosma. Não se escondem o nojo e desgosto estampados em minha face. Ele o percebe, para um pouco e pergunta se deve parar. Balanço a cabeça, discordando meu corpo todo pede por ele, quer prosseguir. Não o rejeita apesar do nojo. Não é seu corpo que me repele, sua pele, seu toque, mas a dor que dele sinto. Atormenta-me e nos devora. Ele sofre e eu sofro, meu corpo não se desenlaça dele, meu pensamento não afasta de sua imagem, seu gozo e sofrimento.

E num último suspiro de dor lanço versos para o infinito.
Gritos surdos ecoam na noite. Sou eu que te clamo e não me escutas. Escuridão, silêncio. Palavras que se calam nos seus gestos que me revelam.
Olhos profundos que cintilam em minha mente. Afogando-me em seus beijos quentes. Eu a dizer : Te quero somente.
As sombras da solidão me seguem os passos. Triste mas belo sorriso que me acompanha. No embalo da paixão não há quem perde, quem ganha, estamos todos perdidos e entregues as suas artimanhas.
Vozes, palavras soltas, frases descontínuas. Sons, emissões vocais ouvidas ao longe...que irritam seus ouvidos. Vocifera pensando na fragilidade do silêncio, na incapacidade das pessoas de se calarem. Não suportando o silêncio expondo suas imperfeições, seus desgostos, sua deficiência e fragilidade humana, quebram com o desconforto tratando de banalidades. Emitidas palavras vazias de gosto, triviais. Saídas banais vestidas pela naturalidade.